Dias 8 e 9 de outubro, em Caraguatatuba/SP, a Petrobras e a Fundação para a Conservação e a Produção Florestal do Estado de São Paulo (Fundação Florestal) realizaram o Seminário “Recursos do Petróleo no Litoral Norte de SP – Relação de Dependência e Estratégias futuras”, com a participação de gestores do poder público municipal, sociedade civil, ambientalistas, comunidades tradicionais, gestores das áreas protegidas e comunidade científica e acadêmica.
O evento teve como objetivo analisar as consequências do aporte de recursos financeiros advindos da indústria de petróleo e gás no Litoral Norte de São Paulo como, por exemplo, a criação de dependência regional, os riscos da finitude desses recursos e possíveis estratégias de governança sustentável do território a partir deste contexto.
A realização do Seminário é uma condicionante ambiental da Fundação Florestal, dentro do processo de licenciamento federal, conduzido pelo Ibama, do empreendimento Etapa II do pré-sal. (Clique aqui para saber mais sobre a Etapa II).
Na abertura do evento, Diego Hernandes Rodrigues Laranja, diretor do Litoral Norte, Baixada Santista e Vale do Paraíba e Mantiqueira da Fundação Florestal, destacou a responsabilidade da realização desse evento para com todos que se relacionam ou se relacionarão com o Litoral Norte de São Paulo e lembrou do objetivo dessa condicionante. ”O que buscamos é dar transparência para que todo esse aporte de
recursos, que são gerados por esse importante empreendimento, possa ser avaliado e monitorado pelos órgãos públicos e pela sociedade civil, garantindo que seja destinado, de fato, para os benefícios futuros do nosso território”.
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Na sequência, Pedro Henrique Wisniewski Kohler, representando o Instituto de Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), explicou como se dá o processo de licenciamento e respectiva a avaliação do impacto ambiental. “Na prática, essa avaliação se materializa nas emissões das licenças, que definem uma série de condições e exigências que buscam diminuir a intensidade dos impactos dos empreendimentos no meio físico, biótico e socioeconômico de uma região”, pontua.
Pedro lembrou ainda que essa condicionante surgiu da avaliação de que os royalties não representam apenas um impacto positivo, mas também negativo, uma vez que pode acarretar em dependência econômica e geração de expectativa nos municípios. “O impacto vai depender muito de como o recurso será aplicado. Por isso, é importante aprofundar essa discussão para que possamos instrumentalizar a sociedade para uma participação mais efetiva nas políticas públicas”, finalizou.
Marcos Vinícius de Mello, gerente de meio ambiente da Petrobras – unidade de negócio da Bacia de Santos, ministrou a palestra “Pré-sal e os programas /projetos condicionantes da Bacia de Santos”, abordando a gestão ambiental da Petrobras no desenvolvimento da exploração e produção de petróleo no pré-sal e os projetos condicionantes ambientais exigidos no processo de licenciamento. Para concluir, ele destacou a importância da discussão sobre o uso desses recursos para as gerações futuras. “Não podemos esquecer de que os royalties são uma compensação financeira pelo uso de um recurso que é de todo povo brasileiro”.
Para esclarecer as regras e legislação que regulamentam a destinação e valores dos royalties, Roney Afonso Poyares, coordenador da Superintendência de Participações Governamentais da Agência Nacional do Petróleo (ANP), apresentou a palestra “Aporte de recursos do petróleo e gás na região: cenário atual e futuros – compreensão do sistema e os critérios de distribuição de royalties”.
Cada campo produtor de petróleo tem uma alíquota de valor de royalties, que é definida em contrato, e varia de 5 a 15% da receita bruta do campo. Esse valor é dividido entre a União, Estados e Municípios. “A ANP não define isso. Ela apenas faz a distribuição com base nos critérios definidos em uma série de leis e decretos”.
Vale destacar que além dos royalties, existe ainda a “participação especial”, que constitui uma compensação financeira extraordinária devida pelos concessionários de exploração e produção de petróleo ou gás natural, nos casos de grande volume de produção ou de grande rentabilidade.
Sobre o cenário atual e futuro, Roney destacou que, embora a arrecadação de royalties e participações especiais deva se manter estável nos próximos cinco anos, variando entre R$ 56 a R$ 58 bilhões no Brasil, no caso do Estado de São Paulo a estimativa é de queda, saindo de R$ 2,3 milhões em 2019 para R$ 1 milhão em 2023. O município mais afetado por essa queda será Ilhabela, que perderá praticamente a metade do valor que recebe atualmente.
Aprendizado com a experiência de outros municípios
O painel “ Consequências dos aportes de recursos da cadeia do P&G e dependência do uso dos royalties e outros recursos da cadeia do petróleo: experiência no Brasil e no mundo” teve a participação do professor dr. José Luiz Vianna da Cruz, coordenador de pesquisa do programa de mestrado e doutorado em planejamento regional e gestão da Cidade; professor dr. Rodrigo Serra, professor de engenharia de produção da CEFET/RJ e Henrique Diniz de Oliveira, analista de controle externo do grupo de atuação especializada no combate à sonegação fiscal e aos ilícitos contra a ordem tributária – GAESF/Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.
Um dos destaques foi a experiência dos municípios do Norte Fluminense: a dependência da renda petrolífera levou a uma profunda crise quando houve queda na arrecadação a partir de 2014. Algumas saídas apontadas pelos integrantes do painel passam pelo uso planejado dos recursos, pela vinculação desses recursos para realização de investimentos ou ainda a criação de um fundo soberano.
“A experiência mostra que não se pode pensar em uma solução individual para cada município: os impactos positivos nos municípios ricos provocam impactos nos municípios pobres, que retornam aos ricos como negativos: quanto maior é a desigualmente, maior esses impactos. Basta ver o mapa da violência de Campos e Macaé”, pontuou o professor dr. José Luiz.
O segundo painel do dia abordou o tema “Consequências dos aportes de recursos da cadeia do petróleo no litoral norte de SP”, com a participação de Gilda Nunes, presidente do Conselho Municipal de Meio Ambiente de Ilhabela e Carlos Nunes, diretor executivo do Instituto Ilhabela Sustentável.
Foram apresentados como a participação e o controle social podem ser uma forma de mitigação, pelo menos parcial, dessa dependência aos recursos. Com a atuação do Instituto em Ilhabela (município que tem 79,8% das suas receitas advindas dos royalties e participações), foi possível alcançar grandes avanços como a criação do fundo soberano do município com o aumento gradual do percentual destinado, compromisso no investimento em pontos fundamentais para a população, como saneamento básico e convênio com a Fundação Florestal para ampliar o turismo no parque estadual.
Segundo dia foi de debate e diálogo sobre os próximos passos
A palestra “Como as regulações e instrumentos de ordenamento territorial dialogam para construção de um cenário futuro da região” abriu as discussões do segundo dia do evento. Com a apresentação de Patrícia Menezes Cardoso, advogada e doutoranda da universidade de Coimbra, e mediação da professora dra. Simone Mendonça dos Santos, da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, foram levantados os desafios do cenário atual, como a revisão do marco regulatório do pré-sal e a entrada de novos operadores, e também os instrumentos de controle social para a construção de um futuro da região.
Para finalizar o evento, foi realizada uma grande mesa de debate e diálogo sobre o tema “Controle social do aporte de recursos da indústria de petróleo e gás no litoral norte: o que já foi feito e o que ainda deve ser feito “, com a moderação do professor dr. José Luiz Vianna da Cruz e a participação de Pedro Henrique Koehler, do Ibama; Gilda Nunes, do Conselho de Meio Ambiente de Ilhabela; Thiago Correa, secretário de Fazenda de Ilhabela; Ricardo Romera, secretário de Fazenda de Caraguatatuba; Marci Antonio Guti, presidente da Câmara de Vereadores de Ilhabela; Marcio José dos Santos, gestor da APA Marinha Litoral Norte, representando da Fundação Florestal; Kelen Leite, representando o ICMBIO, além de representantes das comunidades tradicionais: Vagno Martins da Cruz, caiçara de São Gonçalo; Luiz Cláudio Bernardes, o Santiago, caiçara de Ubatuba e Ivanilde Pereira da Silva, indígena da Aldeia Yakã Porã.
Na parte da tarde, a sociedade civil presente com a mediação da Fundação Florestal conduziu uma grande roda de debate entre os participantes para discutir possíveis ações a serem realizadas com base em tudo o que foi discutindo durante o evento.
Acesse as apresentações realizadas durante o Seminário: